Artigo: The Mandalorian (Por Sid Castro)

Ainda em cartaz nos cinemas do mundo todo, Star Wars IX – Ascensão Skywalker é o último filme das três trilogias iniciadas por George Lucas em 1977. Fenômeno de mídia e marketing que mudou a indústria do cinema no século XX, a primeira trilogia é a única que permaneceu praticamente intocável para os fãs – que não são pouco ‘fanáticos’ pela série, a ponto do dia de estreia da saga (25 de maio) ser considerado o “Dia do Orgulho Nerd”. Ou da Toalha, mas isso é outra história…

Nos anos 2000, Lucas finalmente realizou a segunda trilogia, desta vez como ‘prequel’, contando como tudo começou, mas com um sucesso relativo, se comparado com a anterior, principalmente. Durante anos, pareceu que nunca aconteceria a prometida trilogia do ‘futuro’ prometida por Lucas, contando o que aconteceu após O Retorno do Jedi. Star Wars, entretanto, não parou, com o chamado ‘universo expandido’ sendo explorado em coleções de livros, quadrinhos, animações e games, criando novos personagens, monstros, Jedis e batalhas, além dos já conhecidos, preenchendo lacunas entre os filmes.

Até que, finalmente, a Disney resolveu dar um destino ($) àquela saga toda, comprando por quatro bilhões de dólares os direitos da obra de George Lucas, que ainda ficou com certas prerrogativas e ganhando (mais) dinheiro com ela, recebendo percentagens enquanto seus personagens fossem usados da forma original. Em parte, isso explica porque eles foram ‘desaparecendo’ ou ‘mudando’ progressivamente (e não apenas pela idade dos atores) e novos robôs e aliens iam surgindo, estes já sem direito a percentagens de royalties para Lucas e seus herdeiros.

A nova trilogia Disney, entretanto, careceu de um projeto e metas claras, o que não aconteceu com outra franquia comprada por ela, a Marvel, já estabelecida tanto nos quadrinhos quanto nos filmes. Produtores, roteiristas e diretores tinham planos próprios e divergentes sobre como conduzir Star Wars, e isso ficou patente nos dois últimos filmes. Por outro lado, a Disney ignorou (o contrato de compra de Star Wars não a obrigava) a usar os roteiros e ideias que George Lucas tinha para a trilogia final – preferiram criar novos personagens com características difusas dos antigos e roteiros que, na estrutura, recauchutavam a trilogia original.

Além da Disney não vender seus bonequinhos como queria, os novos filmes não renderem tanto quanto se esperava e a produtora foi forçada a mudar seus planos de lançar um Star Wars a cada ano – 2020 será o primeiro desde 2015 que não vai ter um novo filme da franquia. Com a flopada de Han Solo, o filme do caçador de recompensas, Boba Fett, previsto para 2020, foi cancelado. Mas outro mandaloriano surgiu no lugar.

The Mandalorian (O Mandaloriano), série em cartaz com apenas oito episódios, lançado pelo Disney +, canal de streaming que só chega aqui ano que vem, e que, por isso mesmo, já deve ser a série mais pirateada no Brasil desde Game of Thrones.

Criada por Dave Filoni (diretor da animação The Clone Wars e que muitos indicam como o ‘herdeiro’ da saga) e Jon Favreau, diretor queridinho da Marvel (Homem de Ferro), a série aproveita a figura dos mandalorianos, um povo de caçadores de recompensas que apareceu numa ponta em O Império Contra Ataca, sempre cobertos por um capacete e com jatos voadores nas costas. The Mandalorian pode ser definido como um western espacial misturado com filme de samurai (no caso, o mangá Lobo Solitário e Filhote). Seguimos as aventuras de um caçador de recompensas mandaloriano e sua armadura de aço Beskar que tem uma simbologia até quase que religiosa para seu povo, a começar pelo capacete que o personagem, vivido pelo ator Pedro Pascal, jamais tira diante de seres vivos (bem, ele retirou no último episódio para um droide que, a rigor, não é um ser vivo…). Mas quem disse que a Disney não poderá vender bonequinhos novos? Temos o fofo ‘Baby Yoda’ (nome desconhecido, mas inspirado no venerando mestre de Luke Skywalker), um misterioso e poderoso bebê de apenas 50 aninhos que interessa muito (vivo ou morto) aos remanescentes do império na periferia de uma galáxia muito distante. E ao longo dos episódios temos um desfile de novos personagens como um mortal droide assassino e a lutadora Gina Carano no papel da fortona ex-soldado Cara Dune.

Monstros, robôs, troopers, batalhas espaciais em sórdidos planetas povoam a série, no melhor estilo do primeiro Star Wars, para alegria dos fãs. Em muitos momentos, a série evoca, com seu cavaleiro sem rosto, antigos pistoleiros sem nome de western spaghettis. As paisagens rudes e desérticas e os duelos contra troopers acentuam o clima, com a trilha sonora de Ludwig Göransson. Entre os diretores, nomes pouco conhecidos e de destaque como o próprio Dave Filoni (Rebels), Taika Waititi (Thor: Ragnarok), Rick Famuyiwa (Dope) a atriz Bryce Dallas Howard (Jurassic World) e Deborah Chow (Jessica Jones).

The Mandalorian se passa depois de O Retorno do Jedi, com a queda do Império de Palpatine e a reorganização da galáxia que culminará na nova trilogia de Rey, Kylo Ren e companhia. Mesmo assim, a série prometeu (e a meu ver, cumpriu) retomar várias das características originais da franquia clássica, com o desfile de cenários conhecidos, povos e monstros habituais ao universo de Star Wars como os Jawas, embora sem a presença, pelo menos nessa primeira temporada, de Jedis, tratados de passagem como ‘lendários’.

The Mandalorian talvez se torne o caminho para a recuperação de Star Wars no cinema. Enquanto isso, novas séries estão sendo planejadas (ou especuladas) para o Disney +: além da segunda temporada do Mandaloriano prevista para o outono de 2020, fala-se numa série live action de Obi-Wan Kenobi, com Ewan McGregor, assim como mais uma da jovem Leia Organa, com Millie Bobby Brown, de Stranger Things. Outro derivado seria uma história paralela a de Rogue One: Uma História Star Wars e estrelada pelos atores Diego Luna e Alan Tudyk, que estiveram no filme de 2016. Todas essas séries seriam experimentos para futuros filmes no cinema, dependendo do sucesso de cada uma, abrindo caminhos novos dentro do universo de Star Wars – ou o inverso, no caso de Rogue One, por muitos considerado o único Star Wars de verdade da nova safra.

“E tenho dito”, como diz o slogan de um personagem vivido digitalmente em The Mandalorian pelo ator Nick Nolte.
“Como tem de ser”, responderia O Mandaloriano.

 

Sid Castro é autor de literatura fantástica com 17 antologias publicadas por diversas editoras brasileiras, e roteirista/desenhista/diagramador das revistas de quadrinhos Calafrio e Mestres do Terror.
Na Amazon publicou a coletânea Memórias pós-humanas de Quincas Borba, com histórias de ficção científica envolvendo distopias sociais e tecnológicas, super-humanos e alienígenas, batalhas interplanetárias, viagens no tempo, no espaço e outras dimensões do universo, tudo sob o olhar antropofágico do chamado ‘País do Futuro’ descortinado por Stefan Zweig. Noveletas que partem de uma visão futurista da obra de Machado de Assis até a ascensão de uma Iemanjá cósmica; batalhas entre vikings espaciais e dragões alienígenas, sob o olhar de um indígena brasileiro atemporal; um Brasil teocrático e autoritário à espera da chegada de Deus; a procura do Amor através de universos alternativos e a jornada de Inteligências Artificiais em busca de liberdade e redenção.

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